quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Terapia Pelo Dia 4 - Estágios da Loucura

Quarta-Feira, 07/11/2007


Saí atrasada de casa, no meio do
caminho lembrei que esqueci de colocar fralda na mochila do JP e roupas extras. Dirigi perigosamente da escolinha até a fisioterapia... "Engraçado... perdi o medo dos radares... e de capotar o carro..." pensei comigo mesma...










No retorno com o médico ele me deu mais dois di
as de afastamento do trabalho... Bom pra dor.. ruim pra mim que teria que ligar no trabalho e avisar... "você precisa ligar logo e avisar" dizia a voz ao meu lado enquanto eu tremia de horror de medo de ter que dar a notícia... " isso é medo do telefone ou medo do chefe???" perguntava a mesma voz...
Enfrentei o medo e liguei... "Oras bolas, estou doente... estou com dor... Não estou com medo de nada!!!!" respondi para a voz




Liguei e pronto... assunto encerrado... Mas ainda precisava descarregar aquela energia negativa acumulada... "Coma alguma coisa bem doce e gostosa..." ouvi a voz sugerir. "Não... estou tentando emagrecer!!" respondi firmemente para a voz. Alguns minutos em silêncio e então a voz voltou a dizer: "Você está começando a babar... deve estar com fome... tem aquele panetonne gostosinho, lembra???"... Lembrei do Panettone... e como as pessoas normais fazem qualquer coisa pra não babar de loucura... bem, atendi a sugestão daquela vozinha amiga e ataquei o panettone como se a palavra dieta fosse estranha ao meu dicionário.


Após mais uma tarde ociosa, deitada, com dor, tomando remédio à base de morfina, fui buscar o JP na escola. No caminho ele, que tem dois anos de idade, me disse que desobedeceu a professora e que ela bateu nele... Fiquei furiosa com ele por ter certeza de que era mentira... e morri de medo de que ele tivesse o gene da mentira tal qual o pai...a voz me dizia "Não dê uma de mãe louca... nem pense em ligar pra escola pra tirar satisfação... ele é um criança e crianças tendem a fantasiar"... Respirei fundo, e continuei adiante... Chegando em casa uma voz diferente daquela com quem eu conversei o dia todo me disse "Você devia ligar lá sim.. tire a limpo essa história... você é boa nisso... a vivência com o pai dele deixou você uma expert em 'tirar mentiras à limpo'... use seu dom..."... Perguntei "Quem está falando agora?" foi quando me dei conta de que eu tinha conversado com o NADA o dia todo... e só agora me perguntava "Quem está falando?"... Meu Bom Deus do Céu... Lembrei daquele velho dito popular "As paredes têm ouvidos..." e pensei comigo mesma "se elas tem ouvidos devem tre bocas também... logo devo estar recebendo um sábio conselho de uma parede amiga..." , e diante de minha brilhante conclusão, liguei na escolinha... enquanto fazia a pergunta ao telefone fui, aos poucos, me dando conta, de que estava agindo como uma mãe louca... Desliguei morrendo de vergonha... "Puxa vida, esqueci de um dos dois remédios... mas qual foi?? O Ansiolítico ou o Tranqüilizante???"... Ouvi a primeira voz dizer "O tranquilizante - que é sem trema por causa da reforma gramatical..." a outra voz respondeeu contrariamente "Você se esqueceu do ansiolítico..."... Fiquei confusa... "Qual das duas será realmente a voz amiga???"... Fiz um esforço mental pra lembrar qual eu tinha esquecido... e assim a voz que estivese falando a verdade eu poderia confiar... "Esqueci do ansiolítico!!! A segunda voz estava certa... mas ela mentiu sobre o JP na escolinha... Logo, as duas devem ser boas... apenas são... são... humanas??? e erram de vez em quando???"... Quando fui tomar o outro remédio pra dor vi que estavam faltando dois comprimidos... surtei com o João Pedro... E lá era eu a mãe-louca novamente... "Filho, por que você tomou meu remédio??" perguntava desesperadamente enquanto lia na bula os efeitos do remédio em crianças... "Uso Adulto" dizia na bula... "O uso desse medicamento não é recomendado para crianças"... E o desespero crescia... e eu não acreditava nele dizendo "Eu não tomei, mamãe"... Fiquei brava demais e coloquei ele de castigo... Antes de deitar lembrei que eu realmente tinha tomado o remédio... e que, portanto, ele estava falando a verdade... Pobre João...


Antes de deitar decidi fazer uma lista de coisas que eu não posso esquecer de fazer... e nomeei a tal lista como "Guia de Sobrevivência". A lista é dividida por tópicos e é basicamente um lembrete bem grande de coisas fundamentais que eu não posso esquecer...



Consiste nos seguintes assuntos:

    • mochila do JP
    • lanche do JP
    • remédios
    • rotinas do dia (acordar, tomar café-da-manhã, dirigir cuiadadosamente, não sair atrasada todos os dias, trancar portas, não deixar as chaves do carro no contato nem os vidros abertos... enfim...)
    • coisas pra fazer antes de dormir (checar a lista e ver se eu fiz tudo direito)
Tirei várias cópias, coloquei fitas dupla-face atrás delas e espalhei pela casa...

Antes de dormir, olhei mais uma vez praquela lista quase ridícula e repassei tudo na cabeça...
"Meu Deus, devo mesmo estar ficando louca!!! Preciso fazer lista pra lembrar de trancar a porta de casa, nos dias de hoje???"... (pelo menos desta vez estava conversando com alguém que muita gente coversa... )... "Fiz tudo??"...A primeira voz respondeu "Talvez você tenha se esquecido de trancar as portas... melhor dar uma olhada no carro também..."... A segunda voz, contrária à primeira dizia "Relaxa e vá dormir... você está precisando disso"... Respondi bem brava: "Calem-se... vocês estão me enlouquecendo... não tenho tempo pra decidir qual de vocês é a Raquel e qual é a Rutinha... preciso dormir"... Coloquei a cabeça no travesseiro e pela primeira vez durante o dia me senti lúcida... "Lucidez é sinal de não-loucura" insistiu a segunda voz, querendo ainda puxar papo.... e a primeira disse "É sim... só pode estar lúcido quem tem suas fases de loucura...". Virei pro lado e deixei as duas discutindo... mas a última coisa que pensei antes de, finalmente adormecer foi "Concordo com você, primeira voz amiga...Lembrei do ansiolítico????"

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